«Esta história merece estar escrita.»
José Mariano Gago
Manuel José de Castro Petrony de Abreu Faro foi uma personalidade marcante na segunda metade do séc. 20, tendo contribuído decisivamente para a criação das modernas bases para a ciência em Portugal. Várias foram as ocasiões em que o Instituto Superior Técnico (IST), onde lecionou até à sua jubilação em 1993, lhe prestou homenagem, nomeadamente por ocasião da sua última lição e da sua jubilação, que juntaram à sua volta muitos colegas, amigos e alumni que jamais esqueceram o seu entusiasmo contagiante e a sua insaciável curiosidade científica.
Por ocasião do que seria o seu 90.º aniversário, em 26 de novembro de 2013, o Técnico prestou-lhe uma homenagem mais do que merecida. A sessão de homenagem no Salão Nobre nasceu por iniciativa do Departamento de Engenharia Eletrotécnica e de Computadores, ao qual sempre pertenceu, mas contou com o apoio imediato e entusiástico da presidência da escola. O Complexo Interdisciplinar I, um dos seus muitos legados, tem desde essa data o anfiteatro com o seu nome.
Com o apoio inestimável da família, daqueles que foram seus alunos e do Núcleo de Arquivo do Técnico, procurou-se recuperar informação sobre a sua atividade científica, pedagógica e política, recolhendo textos, fotografias e vídeos. Dos muitos documentos recuperados, atualmente acessíveis no Núcleo de Arquivo, uma parte muito significativa é proveniente do seu antigo gabinete no Complexo, e uma outra, generosamente doada pela família, encontrava-se no escritório da sua casa.
O portal inicial, lançado nessa mesma data, incluía apenas um pequeno conjunto de fotografias, mas rapidamente se enriqueceu com todos os testemunhos daqueles que tiveram o privilégio de o conhecer, partilhados através de correio eletrónico e das redes sociais.
Em março do ano seguinte, tentámos dar a conhecer Abreu Faro a uma nova geração de alunos, através de um pequeno stand nas Jornadas de Eletrotecnia e Computadores (JEEC), onde se expuseram alguns documentos e obras do professor, entrevistas em vídeo e equipamento científico de telecomunicações, adquirido aquando da criação do Complexo. É-nos, no entanto, impossível recriar para esta nova geração de alunos a magia das suas aulas.
Já no final de 2015 foi instituído o Prémio Professor Abreu Faro para a melhor tese de doutoramento nas áreas das telecomunicações, eletrónica e computadores. O prémio foi instituído pelo IST sob proposta do Departamento de Engenharia Eletrotécnica e de Computadores, mas conta também com o apoio dos Departamentos de Engenharia Informática, de Física e de Matemática, sendo atribuído em cada dois anos.
Fez-se coincidir a primeira edição do prémio, com o patrocínio da ANACOM, com uma outra homenagem por parte da Academia das Ciências de Lisboa, a que Abreu Faro presidiu já no final da sua vida. A Sessão Académica do Elogio Histórico teve lugar no dia 19 de fevereiro de 2015 e ficou também marcada pelo lançamento oficial de uma exposição virtual, em que está patente uma amostra da documentação recuperada. Um dos pontos altos desta exposição é a inclusão dos vídeos das últimas aulas de Abreu Faro, gentilmente cedidos por Miguel André Filipe.
O sonho cresceu à medida que fomos acumulando mais material e mais testemunhos. Cedo se percebeu que, à semelhança de homenagens a outras personalidades marcantes da vida do Técnico, como Alfredo Bensaude e Duarte Pacheco, havia recursos humanos e materiais para que a homenagem a Abreu Faro fosse também perpetuada num livro.
Demasiado ambiciosos, pretendíamos com este livro cobrir tudo, desde uma breve perspetiva sobre as suas origens até ao seu contributo mais literário, focando todas as suas facetas: a de docente, a de investigador e orientador, a de académico na política científica e ainda a sua faceta menos conhecida, a de “poeta” da ciência.
Para o capítulo sobre as suas origens, o papel da família foi mais uma vez fulcral, em estreita colaboração com o Núcleo de Arquivo. Para o capítulo sobre o ensino das telecomunicações, contámos com quem partilha da mesma paixão de Abreu Faro de passar aos alunos o entusiasmo por esta área.
Num dos muitos testemunhos vibrantes que recolhemos no portal, soubemos da intenção de um antigo colega de Abreu Faro de editar um livro sobre o mesmo. O capítulo “Sínteses do que Abreu Faro disse” poderia assim ser um livro dentro de um livro, dando-nos uma perspetiva única de alguém que teve o privilégio de privar com Abreu Faro não só como aluno e colega, mas acima de tudo como amigo.
Só três pessoas poderiam escrever sobre a faceta de Abreu Faro como orientador científico, uma delas, a Prof.ª Hermínia Marçal, recentemente falecida. Coube assim aos outros dois a tarefa de falar não só desta faceta, como também do seu próprio trabalho de investigação.
O texto sobre Abreu Faro como académico na política científica foi pedido a José Mariano Gago, não só pelo seu próprio percurso enquanto ministro da Ciência e Tecnologia, mas também pela demonstração de toda a admiração e amizade que sentia por Abreu Faro, partilhada no testemunho que proferiu na primeira sessão de homenagem. Quando lhe lançámos o repto, de imediato anuiu. Voltou a demonstrar a sua disponibilidade na sessão de homenagem na Academia das Ciências de Lisboa, porventura o último discurso antes da sua morte. O capítulo, tal como ele o tinha pensado, não pode existir dada a sua morte precoce – em seu lugar estão as transcrições das suas intervenções. Mas a faceta de académico na política científica não ficou esquecida, graças ao trabalho de investigação do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa.
Abreu Faro nunca se considerou um cientista. Segundo as suas próprias palavras: “Estudei, tentei perceber, ensinei o melhor que soube. Mas procurei tudo fazer para que outros, para que vocês, meus alunos, fossem para fora, aprendessem a fazer ciência, a ser cientistas, e talvez um dia a fazer ciência em Portugal.”
Este papel de Abreu Faro fica bem patente no capítulo que intitulámos “Uma geração de fundadores” e que integra, para além do testemunho de José Mariano Gago, os testemunhos de José Fonseca de Moura, Carlos Salema, João Sentieiro e José Tribolet. Sem ter a veleidade de escrever sobre a história da ciência moderna em Portugal, este livro, por todos os testemunhos que inclui na íntegra, será talvez uma contribuição fundamental nesse sentido.
Mas estes não são os únicos testemunhos que integrámos. Muitos outros seus alunos e colegas quiseram associar-se a esta homenagem, recordando com muita saudade o mestre emblemático que nunca esquecerão. Esperamos rever todos na sessão de lançamento do livro, em 2016, aquando das comemorações do aniversário do Técnico.
A lista de pessoas a quem gostaria de agradecer por este livro não tem fim. À família, em primeiro lugar, por todo o carinho que dedicou a todas as iniciativas. A todos os autores, pelos seus contributos, que nos fazem descobrir e recordar esta figura ímpar da história da ciência em Portugal.
Um agradecimento muito especial é, no entanto, devido a três pessoas, sem as quais nada disto teria sido possível: à Dr.ª Filipa Soares, do Núcleo de Arquivo do IST, ao Prof. João Pedro Gomes, membro da Comissão Executiva do DEEC, e à Prof.ª Palmira Silva, vice-presidente para a Comunicação e Imagem do IST.
Por fim, um agradecimento ao professor José Mariano Gago, pela mensagem que nos deixou e que nos tem guiado em todas as etapas da criação deste livro: “Esta história merece estar escrita.
Prof.ª Isabel Trancoso